Para que a introdução à álgebra seja natural, é preciso questionar conhecimentos aritméticos e mostrar como eles são usados nas equações
Durante os primeiros anos da Educação Básica, a garotada está
acostumada a estudarMatemática com
problemas aritméticos que envolvem as quatro operações, trabalhadas numa
complexidade crescente de números grandes, frações e racionais.
Letras são usadas somente para representar grandezas,
como "m" para metro, "g" para grama e "l" para
litro. Imagine, então, o susto dos alunos ao chegar ao 6º ou 7º ano e dar de
cara com uma questão do tipo 2a + 13 = 33. Não bastasse saber somar,
subtrair, dividir e multiplicar, agora eles precisam desvendar o valor das
letras. Mas como fazê-lo se a "conta" aparentemente já está
resolvida? Afinal, ao contrário do que acontecia até esse momento, tem um
número depois do sinal de igual...
O estranhamento na cabeça das crianças é natural. "Elas sentem a perda de sentido do que já sabem e julgam as dificuldades operatórias difíceis de serem superadas", diz Ivone Domingues, coordenadora pedagógica da área de Matemática da Escola da Vila, em São Paulo. De fato, a compreensão da álgebra - a parte da disciplina que estuda leis e operações com entidades abstratas, geralmente utilizando letras para representar valores desconhecidos - exige que a tur ma repense saberes que funcionavam bem com as operações aritméticas. A pesquisadora argentina Patricia Sadovsky defende que seu papel, professor, é fundamental para apresentar a passagem da aritmética à álgebra como continuidade e não como ruptura.
O estranhamento na cabeça das crianças é natural. "Elas sentem a perda de sentido do que já sabem e julgam as dificuldades operatórias difíceis de serem superadas", diz Ivone Domingues, coordenadora pedagógica da área de Matemática da Escola da Vila, em São Paulo. De fato, a compreensão da álgebra - a parte da disciplina que estuda leis e operações com entidades abstratas, geralmente utilizando letras para representar valores desconhecidos - exige que a tur ma repense saberes que funcionavam bem com as operações aritméticas. A pesquisadora argentina Patricia Sadovsky defende que seu papel, professor, é fundamental para apresentar a passagem da aritmética à álgebra como continuidade e não como ruptura.
Quais conteúdos questionar, quais saberes construir
A chave é mostrar que tudo que se aprendeu nas séries
iniciais segue sendo válido. Mas que, quando se trata de resolver equações,
alguns procedimentos precisam ser modificados. A sequência de operações é um
deles. Durante o trabalho aritmético, as crianças costumam lidar com problemas
que pedem resultados com base em dados previamente estabelecidos, que se
caracterizam pela importância da obtenção de informações intermediárias. Como o
que ocorre em "Tenho 200 bonequinhos e comprei mais 50.
Depois, dei 30 para meu amigo. Com quantos fiquei?". O mais
usual, em situações como essa, é realizar as operações em sequência (primeiro,
somam-se 200 e 50. Depois, subtrai-se 30 desse total).
No fim, chega-se ao resultado - quase sempre, um número "de verdade".
A álgebra opera por uma lógica diferente. Considere o seguinte exemplo: "Sabendo que o produto de dois números é 5.542, qual será o resultado se somarmos 1 ao primeiro dos números e depois o multiplicarmos pelo segundo?" Perceba que o passo a passo aritmético não funciona nesse caso. Aqui, a tradução para a linguagem matemática tem de envolver, de uma vez só, todas as informações, gerando duas equações: a x b = 5.542 e (a + 1) x b = c, sendo "a" e "b" os dois números multiplicados e "c" o valor pedido no enunciado.
A álgebra opera por uma lógica diferente. Considere o seguinte exemplo: "Sabendo que o produto de dois números é 5.542, qual será o resultado se somarmos 1 ao primeiro dos números e depois o multiplicarmos pelo segundo?" Perceba que o passo a passo aritmético não funciona nesse caso. Aqui, a tradução para a linguagem matemática tem de envolver, de uma vez só, todas as informações, gerando duas equações: a x b = 5.542 e (a + 1) x b = c, sendo "a" e "b" os dois números multiplicados e "c" o valor pedido no enunciado.

Em seguida, é preciso construir novos conhecimentos. É
fundamental explicar o que significam os tais "a", "b" e
"c" que aparecem nas operações. Não basta dizer que são "números
desconhecidos": dependendo do contexto matemático, as letras podem se
comportar como incógnitas (valores fixos) ou variáveis (que podem assumir
diversos valores). Uma boa maneira de sublinhar essa diferença é pela
comparação de problemas. Suponhamos que um primeiro busque o número de
triciclos e bicicletas numa garagem, explicitando que há 100 rodas no
total. A resposta, então, é 3t + 2b = 100, com muitos valores possíveis
para a quantidade de triciclos ("t") e bicicletas ("b").
Isso ocorre porque faltam elementos que determinem a situação: se tenho oito
triciclos, serão necessariamente 38 bicicletas (3 x 8 + 2b = 100; 24
+ 2b = 100; 2b = 100 - 24; 2b = 76; b = 38).
A segunda proposta tem os mesmos dados e busca encontrar o número de bicicletas. No entanto, revela que há 10 triciclos. Assim, resta somente uma variável (o número de bicicletas), que, por estar envolvida com outros elementos fixos (3 x 10 + 2b = 100), é uma incógnita, um número determinado: se 10 triciclos somam 30 rodas, as 70 restantes são divididas pelas bicicletas, resultando 35.
A segunda proposta tem os mesmos dados e busca encontrar o número de bicicletas. No entanto, revela que há 10 triciclos. Assim, resta somente uma variável (o número de bicicletas), que, por estar envolvida com outros elementos fixos (3 x 10 + 2b = 100), é uma incógnita, um número determinado: se 10 triciclos somam 30 rodas, as 70 restantes são divididas pelas bicicletas, resultando 35.
As boas estratégias didáticas incluem etapas de generalização
Agora que já sabemos o que fazer, vamos discutir como apresentar esses conteúdos à garotada. Uma coisa é certa: os especialistas não recomendam despejar, logo de cara, um caminhão de algoritmos repleto de letras. "A generalização, algo essencial para o entendimento dos conceitos algébricos, não nasce do acúmulo de evidências pontuais em exemplos", afirma Ivone. Em vez disso, é mais adequado propor atividades em que a própria turma identifique essas regularidades partindo das operações já conhecidas.
Com as sucessivas tentativas, a garotada vai concluir que o resultado que buscamos (o produto do dobro do primeiro pelo triplo do segundo) independe dos fatores em questão. Aí, sim, é hora de mostrar que a Matemática possui uma maneira de escrever esse tipo de raciocínio generalizado, simplificando o processo (no exemplo, ab = 9.786 e c = 2a x 3b = 6ab = 6 x 9.786 = 59.256, sendo "c" o número pedido no enunciado). A notação obtida pela aplicação depropriedades multiplicativas (comutativa e associativa, aprendidas no estudo da aritmética) aponta que a resposta esperada (o "c") é seis vezes o resultado inicial, sem que seja necessário descobrir "a" e "b".
Desafios com conceitos geométricos também colaboram na construção da generalização. Por exemplo, uma sequência de bolinhas que forme quadrados perfeitos. A primeira tem uma bola:
FIGURA 1
A segunda leva duas bolinhas na base e duas na altura, totalizando 4:
FIGURA 2
A terceira tem três na base e três na altura, somando 9:
FIGURA 3
Desafie a classe a descobrir quantas bolinhas terá a figura 5. Observando os quadrados anteriores, alguns alunos vão notar que o total de bolinhas é dado pelo número da figura multiplicado por ele mesmo. Outros argumentarão que o resultado pode ser obtido multiplicando o número de bolinhas da base pelo da altura. Os dois caminhos estão certos.
Com base nessas observações, a garotada concluirá que, para a quinta figura, o total é 25. Nesse momento, você pode propor a sistematização matemática da descoberta ao mostrar uma fórmula do tipo t = n X n, sendo "t" o total de bolinhas e "n" o número de bolinhas da base e da altura ou o número da figura.
Por meio dessas estratégias, os estudantes compreendem que a elaboração de fórmulas é a forma convencional de generalizar um raciocínio. Aprendendo a montar algoritmos e equações e sabendo o significado das letras que representam incógnitas e variáveis, eles entendem melhor a lógica que estrutura a álgebra e comprovam sua utilidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário